Três caminhos errados das Big Techs


Dedicar um tempo para fazer um produto bem feito soa muito menos emocionante do que “agir rápido e tolerar falhas”

Por Brooke Master – Valor/Financial Times 29/12/2022

Durante 20 anos, as gigantes do Vale do Silício e suas colegas definiram o padrão para o sucesso empresarial com um conjunto simples de estratégias: inovar rapidamente e gastar muito para conquistar clientes. A velocidade, em vez da perfeição, e o alcance, em vez dos lucros, provaram ser a chave para estabelecer posições dominantes que permitiram a elas afastar, esmagar ou comprar rivais potenciais.

Empreendedores de todas as partes prestaram atenção nisso, e a premissa de que crescer em escala e alcançar a lucratividade era a parte mais fácil tornou-se dominante para muito além das plataformas da internet de onde essas ideias se originaram.

Os investidores, desesperados por crescimento e taxas de retorno em meio a juros historicamente baixos, ficaram mais do que contentes em dar prioridade à promessa de crescimento e não aos ganhos de curto prazo. Durante a pandemia, essa tendência se tornou extremada, enquanto as ações de empresas com grandes sonhos e perdas igualmente grandes disparavam para alturas vertiginosas.

Inovar rápido e gastar muito para conquistar clientes. A velocidade, em vez da perfeição, e o alcance, em vez dos lucros, provaram ser a chave para estabelecer posições dominantes que permitiram a elas afastar, esmagar ou comprar rivais potenciais

Esses dias acabaram. A inflação e a elevação de juros dos bancos centrais mudaram o cálculo financeiro. Quando os investidores podem obter retornos mensuráveis de depósitos bancários e títulos de primeira linha, os investimentos especulativos que prometem crescimento perdem sua vantagem. Os preços das ações de Google, Amazon e Facebook caíram entre 40% e 60% com relação a um ano antes, e seus concorrentes mais novos saíram-se ainda pior. Um índice do Goldman Sachs de empresas de tecnologia não lucrativas caiu 77% desde seu pico, em fevereiro de 2021.

Também há uma sensação cada vez maior de que os desafios mais importantes do nosso tempo – melhorar a área da saúde, reduzir as emissões de carbono, basicamente qualquer coisa que envolva o mundo real em vez de um produto apenas digital – exigirão uma abordagem diferente.

A maior parte das grandes empresas de tecnologia ficou rica com softwares, que podem ser atualizados com facilidade e cuja distribuição em grande escala sai praticamente de graça. Esse tipo de inovação online dá uma enorme ênfase, e com razão, ao modelo “failing fast” (algo como falhar rápido em português): lançar um produto com rapidez, conquistar seguidores e corrigir os defeitos depois.

O mesmo simplesmente não se aplica no caso de um carro, um medicamento ou mesmo de um novo sabor de carne embalada. Esses produtos precisam funcionar corretamente e atender às normas de regulamentação desde o começo. Instalações de produção e redes de distribuição não podem ser criadas do nada, ou alteradas mais tarde com facilidade.

No âmbito físico, um inovador pode ver sua liderança evaporar diante da concorrência de rivais com experiência em produção e distribuição. A Tesla está descobrindo isso da maneira mais difícil. Sua participação no mercado de veículos elétricos dos Estados Unidos caiu para menos de 65%, em comparação com os 79% de cinco anos atrás. E a S&P Global Mobility prevê que ela cairá para menos de 20% até 2025, à medida que outros fabricantes lancem caminhões elétricos e modelos mais baratos de carros a uma velocidade maior do que aquela com que a Tesla consegue construir novas fábricas.

“O mundo real simplesmente é mais complicado. Mesmo que você tenha um ótimo carro, você precisa construí-lo em uma fábrica. Tem de achar um terreno, conseguir o zoneamento, encontrar pessoas. Não é algo que possa ser testado pelo método A-B”, diz David Millstone, coexecutivo-chefe da Standard Industries, um conglomerado industrial de capital fechado.

A iniciativa da Standard de concorrer com a unidade de painéis solares residenciais da Tesla é um bom exemplo. Depois de anos de muita propaganda, a Tesla registrava uma média de 23 telhados solares por semana no início de 2022, ou cerca de 1.200 instalações por ano.

Quando a segunda fábrica GAF Energy da Standard abrir em 2023, ela produzirá telhas suficientes para revestir 50 mil telhados por ano. Essas telhas solares mais baratas também podem ser instaladas por um telhador convencional munido de uma pistola de pregos, em vez de um especialista. Ainda assim, expandir não tem sido fácil, mesmo para uma empresa que já é a maior fabricante mundial de materiais para telhados. Como grande parte do mundo empresarial dos EUA, a GAF se viu às voltas com a escassez de mão de obra. No fim, precisou criar um programa de capacitação que prepara veteranos das Forças Armadas, pessoas que cumpriram penas de prisão e jovens em situação de risco para trabalhar no setor.

O terceiro grande erro que os imitadores das Big Tech cometeram foi presumir que clientes se tornariam fiéis já desde a sua primeira compra. Muitas empresas de serviços digitais e comércio eletrônico acreditaram que seu rápido crescimento durante os lockdowns da pandemia marcava um aumento duradouro nas receitas, em vez de uma sacudida única e extraordinária que perdeu força rapidamente diante da renovação da concorrência. Alguns dos grandes sucessos da pandemia, como Zoom Video Communications, Delivery Hero e Peloton, estão entre aqueles jogados de volta à vida real.

“Na tecnologia de forma geral, e na área de software especificamente, o efeito de rede é uma fonte de vantagem potencial, mas… o modelo de correr para conquistar participação não funciona em muitos outros setores”, diz David Garfield, chefe mundial para indústrias da AlixPartners.

Dedicar um tempo para fazer um produto bem feito soa muito menos emocionante do que “agir rápido e tolerar falhas”. Mas para a maioria das empresas, na maioria dos setores, isso é quase certamente o caminho para um sucesso mais duradouro.

Brooke Masters é editora de Finanças do FT nos Estados Unidos.

https://valor.globo.com/opiniao/coluna/tres-caminhos-errados-das-big-techs.ghtml

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