Nomes importantes do PIB, como André Esteves, Benjamin Steinbruch e Rubens Menin, já têm rótulos para chamar de seus e estão em busca de aliar qualidade com rentabilidade
André Jankavski e Fernanda Guimarães – Estadão -10 de abril de 2022
Nomes reconhecidos entre o empresariado brasileiro, de diferentes setores da economia, estão descobrindo um gosto em comum e desbravando um mercado bastante diferente de seus negócios de origem.
Aos poucos, a produção de vinhos tem atraído um rol de nomes pesos-pesados do PIB brasileiro, que estão levando a sério o novo empreendimento e profissionalizando a produção. O principal alvo tem sido Portugal, que já recebeu investimentos de Rubens Menin, dono da MRV, e de André Esteves, do BTG Pactual.
Menin passou a investir na famosa região do Douro, conhecida pela qualidade da produção dos vinhos, em 2018. Antes disso, Esteves, do BTG, decidiu apostar nas vinhas portuguesas desde o fim de 2012.
Vinícola da Menin Wine Company, em Portugal, produziu 240 mil garrafas de vinho em 2021DIVULGAÇÃO/MWC
“Este interesse de aquisição de vinícolas por parte de empresários brasileiros está muito relacionado com o prestígio que os vinhos portugueses têm no Brasil. Acreditamos que a imagem dos vinhos de Portugal no Brasil começa a ser prestigiada e atrai investidores brasileiros”, afirma o presidente da Vini Portugal, Frederico Falcão.
Hoje, Portugal é o 9º exportador mundial de vinhos e o 11º maior produtor mundial, mas há também quem esteja buscando oportunidades aqui na América do Sul. A família do empresário Benjamin Steinbruch, presidente da siderúrgica CSN, criou um vinhedo em seu haras na região de Solís de Mataojo, no Uruguai. Já o ex-secretário do Tesouro Nacional, Carlos Kawall, decidiu sair da direção do Asa Bank para tirar um ano sabático e cuidar da sua vinícola na região de Mendoza, na Argentina.
A The Vines of Mendoza atraiu diversos empresários dispostos a ter um vinho próprio, como o economista Carlos KawallDIVULGAÇÃO/THE VINES OF MENDOZA
Os investimentos pesados feitos pelos brasileiros refletem uma paixão crescente pela bebida no Brasil, reforçada durante a pandemia Depois de um salto em 2020, o consumo de vinhos finos no Brasil ano passado foi de 27 milhões de litros, aumento de 11,4% em relação ao ano anterior, de acordo com dados da União Brasileira da Vitinivicultura (Uvibra). Segundo especialistas e os próprios empresários investidores, ainda há um espaço enorme para crescer.
MENIN WINE COMPANY
Rubens Menin
PRESIDENTE DO CONSELHO DA MRV
A CONSTRUÇÃO DE UMA EXPERIÊNCIA
Há tempos, o empresário Rubens Menin decidiu enveredar por outros caminhos além da construção, setor em que criou a MRV, a maior construtora da América Latina. Dono desde banco até emissora de televisão, no entanto, Menin tem dois negócios que acabam também sendo um hobby: o investimento em seu time de coração, o Atlético Mineiro, e a Menin Wine Company (MWC).
E isso não quer dizer que os investimentos foram pequenos. Além de o Atlético ser um dos times mais endinheirados do País atualmente, o empresário, que começou no negócio de vinhos em 2018, já investiu mais de € 30 milhões (cerca de R$ 180 milhões) em 140 hectares de terra na região do Douro, no norte de Portugal. Com vinhos que chegam a custar R$ 2 mil, a produção atual da MWC bateu 240 mil garrafas em 2021.
Rubens Menin, fundador de empresas como MRV e o Banco Inter, entrou para o mercado de vinhos em 2018DIVULGAÇÃO/MWC
Porém, o empresário não está muito animado com o mercado brasileiro: ele quer, de fato, conquistar os europeus. Um dos caminhos para isso é o de criar rótulos desejados e premiados. Um deles, o Douro’s New Legacy Reserva 2018, entrou no ranking dos 30 melhores vinhos tintos em Portugal.
Nos próximos anos, Menin fará mais um aporte de € 30 milhões para construir um resort na região do Douro. Mas não será só isso: para que o local vire um cobiçado ponto turístico, o empresário ainda vai investir em melhorias na região, como transporte fluvial, bondinhos e até um porto. Além disso, também serão compradas novas áreas para vinícolas.
“Temos, talvez, a melhor tecnologia de toda a região do Douro. E vamos continuar investindo”.
Rubens Menin, presidente do conselho da MRV
O presidente do conselho e fundador da MRV diz que está otimista com os lucros futuros na região. Não por acaso, quer ampliar a sua produção para 360 mil litros até 2025. “Portugal, hoje, é um país muito barato e com muito potencial. Se você for para outras regiões, como França e Itália, não há tantas oportunidades.”
HERDADE DOS COELHEIROS
Alberto Weisser
EX-PRESIDENTE DA BUNGE
DEPOIS DA APOSENTADORIA, INVESTIMENTO EM ANTIGA PAIXÃO
Ex-presidente da gigante do setor de alimentos Bunge, Alberto Weisser afirma que sua paixão por vinhos é bastante antiga. No entanto, sua entrada no negócio ocorreu somente em 2015, quando se aposentou, aos 58 anos. Nessa época, bateu o martelo e comprou a Herdade dos Coelheiros, em Alentejo, região próxima à capital portuguesa.
Sobre sua vinícola, o empresário diz que ainda não está no azul, mas que logo chegará lá.
A aposentadoria da vida executiva fez o Alberto Weisser investir em uma paixão antigaARQUIVO PESSOAL
Hoje, Weisser ainda tem presença no mundo executivo, como membro de três conselhos de administração (Bayer, Linde e PepsiCo) e consultor no fundo de private equity Temasek. No entanto, ao contrário de quando comandava uma das maiores fabricantes de alimentos do mundo, Weisser agora consegue equilibrar a agenda entre as duas funções a partir de Portugal.
“Acho que quem investe em vinho é por paixão. Dois terços (da produção) não dão lucro”.
Alberto Weisser, ex-presidente da Bunge
Além da vida nos conselhos, Weisser agora utiliza os conhecimentos adquiridos ao longo da vida executiva em seu novo negócio. Em sua vinícola, após muitos investimentos, tornou a produção orgânica, deixou a produção de vinhos mais baratos de lado e se focou nas garrafas mais premium.
Nesse processo de reformulação, as 400 mil garrafas produzidas anualmente caíram para 100 mil. No Brasil, as garrafas da Herdade dos Coelheiros podem ser encontradas em restaurantes famosos, em lojas especializadas e na adega do Pão de Açúcar. Na Mistral, as garrafas vão de R$ 250 a R$ 1,1 mil. Além do vinho, ele produz nozes, cortiça e ovelhas. E tudo orgânico.
VINÍCOLA VIVALTI
Vicente Donini
EX-PRESIDENTE E ACIONISTA DA MARISOL
A APOSENTADORIA FICOU PARA DEPOIS
Após passar décadas tocando os negócios da Marisol, uma das maiores indústrias de roupas infantis do Brasil e dona de marcas como a Lilica Ripilica, Tigor T. Tigre e a própria Marisol, o empresário Vicente Donini não queria ficar apenas nos quatro conselhos de administração em que atua. Ao mesmo tempo, sabia que não poderia ficar se metendo nos negócios após o processo de sucessão. Decidiu, então, partir para o mundo dos vinhos.
“Do alto dos meus 79 anos, continuo trabalhando todo o dia e o dia todo, só faço o que gosto e gosto de tudo o que faço. Por isso, decidi por desenvolver um novo e audacioso projeto, o da vitivinicultura, o qual requer muita dedicação e disciplina”, afirma Donini.
Após realizar o processo de sucessão da presidência da Mirassol, Donini decidiu deixar a aposentadoria de lado e comprou a VivaltiJAIR SENNA/ESTADÃO
A entrada no mercado ocorreu em 2015 e o empresário escolheu a serra catarinense, mais precisamente a cidade de São Joaquim, e comprou a Vinícola Vivalti, para a qual planejou investimentos na ordem de R$ 10 milhões. O munícipio, graças à sua altitude (entre 1,2 mil e 1,4 mil acima do nível do mar), clima seco e com grande amplitude térmica, além do solo pedregoso balsático, tem atraído diversos empresários interessados no mundo dos vinhos.
Atualmente, a Vivalti conta com uma área de 16 hectares de vinhedos, sendo 12 com uvas plantadas. A vinícola produziu 32,5 mil garrafas de vinho em 2021 e espera chegar a 36 mil neste ano. Porém, o empresário admite que ainda se trata de um negócio em que o retorno do investimento é incerto. Mesmo assim, afirma que a sua meta é transformar a companhia sustentável nos aspectos econômico, social e ambiental. Prevê chegar às 100 mil garrafas na safra de 2029.
“O vinho é uma bebida viva, evolui até quando está presa na garrafa e quando aberta, ele se liberta. Portanto, tudo que tem vida me move e me comove”.
Vicente Donini, ex-presidente e acionista da Marisol
“Por ora, o empenho está em atingir pelo menos o ponto de equilíbrio entre receitas e despesas, o que se dará neste ano, ou seja, no sétimo ano a contar do início das atividades e o quarto desde o início da comercialização”, afirma Donini.
O empresário decidiu entrar nesse mercado também pela paixão pelos vinhos. Segundo ele, em suas viagens a trabalho por outros países, reservava um espaço em sua agenda para visitar vinícolas espalhadas pela Europa, Estados Unidos e na América do Sul, além de parar para realizar viagens juntando gastronomia e o vinho.
GOMEZ KAWALL
Carlos Kawall
EX-SECRETÁRIO DO TESOURO NACIONAL E EX-DIRETOR DO ASA BANK
UM SABÁTICO REGADO A VINHO
Até o início do mês passado, o economista Carlos Kawall era sempre procurado para dar sua visão sobre os dados da economia brasileira. Porém, Kawall decidiu sair do cargo de diretor da gestora Asa Bank e tirar um período sabático. O economista, no entanto, não vai ficar totalmente parado: boa parte de sua atenção será voltada para o rótulo de vinho Gomez Kawall, criado com a sua esposa Priscila, em 2012.
O economista Carlos Kawall decidiu embarcar no mundo dos vinhos com a sua esposa, Priscila, que também é uma apaixonada pela bebidaDANIEL TEIXEIRA/ESTADÃO
Ao contrário de outros empresários, Kawall não comprou terras muito extensas. Na verdade, ele utiliza a estrutura do The Vines of Mendoza, no sul da Argentina, que é um espaço que reúne um resort de luxo e um vinhedo para apaixonados por vinho que querem um rótulo para chamar de seu. O The Vines auxilia em todo o processo: plantação, colheita, enólogos, engarrafamento e até a exportação. A única missão do economista e de sua esposa é comercializar as garrafas, que têm preço médio de R$ 220.
O negócio começou como hobby, mas o economista enxerga potencial para ganhar escala. Ele se baseia no consumo por litro no Brasil em comparação com outros mercados. Apesar de ter tido uma alta com a pandemia, os brasileiros bebem, em média, 2,8 litros de vinho por ano – os argentinos, por exemplo, consomem 27,6 litros, enquanto os portugueses ultrapassam os 51 litros.
“O potencial do vinho é muito grande e é um horizonte de médio a longo prazo, que depende de muitos passos e investimentos”.
Carlos Kawall, ex-secretário do Tesouro Nacional e ex-diretor do Asa Bank
Por ora, o economista acredita que a sua produção de 3 mil a 3,5 mil garrafas ao ano atende à demanda atual, apesar de ter a capacidade para chegar a 5 mil em um curto espaço de tempo. “Mas levando em conta que posso comprar uvas de outros proprietários, poderia ampliar ainda mais, mas aí tem o desafio do mercado e estamos buscando uma qualidade diferenciada, tendo como referência o consumidor”, afirma.
MANZ WINE
André Manz
PRESIDENTE DA MANZ WINE
DO MERCADO FITNESS À UVA RARA EM VILA PORTUGUESA
Vivendo há mais de 30 anos em Portugal, o primeiro negócio de André Manz foi no mercado esportivo: no fim da década de 1980, ele levou a aeróbica coreografada para a Europa. O investimento em vinho, já nos anos 2000, ocorreu sem planejamento, no quintal de onde seria sua casa, em Chelheiros, região do município de Mafra.
No começo dos anos 2000, já com seu negócio no mercado fitness e de eventos consolidados no país, Manz comprou um vinhedo próximo à sua casa e investiu em maquinário, inicialmente pensando no consumo próprio. Mas o negócio foi crescendo. Na primeira colheita, foram encontrados dois tipos de uvas: o Castelão tinto e uma uva branca, que enólogos tiveram dificuldade em identificar. Tratava-se da uva Jampal, espécie portuguesa quase extinta e que garantiu fama e prêmios a uma vinícola muito jovem.
André Manz entrou no mercado de vinho quase por acaso em um vinhedo próximo de sua casa em PortugalARQUIVO PESSOAL
Hoje, a produção anual chega a 500 mil garrafas por ano, que no Brasil são facilmente encontradas em restaurantes “classe A”. Exportando para 28 países, a chegada de Manz no mercado brasileiro não foi das mais simples. Isso porque teve de enfrentar preconceito do público que rejeitava o vinho produzido por um brasileiro em Portugal.
“Foi difícil encontrar importadores para levar nossos vinhos para o Brasil”.
André Manz, presidente da Manz Wine
Além de produzir vinho, Manz decidiu resgatar a história de Cheleiros, com a restauração de edifícios e até mesmo a contratação de uma jornalista para investigar sobre o local, o que rendeu a publicação de um livro. Agora, como empreendedor em série, além de um novo investimento em um restaurante ou bar, vai entrar no mercado de pranchas de surfe, aproveitando-se da proximidade de uma região próxima dedicada à prática do esporte.
EXPEDIENTE
Editor executivo multimídia Fabio Sales / Editora de infografia multimídia Regina Elisabeth Silva / Editores assistentes multimídia Adriano Araujo e William Mariotto / Editor-coordenador de Economia Alexandre Calais / Editor de Negócios Fernando Scheller / Reportagem André Jankavski e Fernanda Guimarães / Designer multimídia Lucas Almeida / Infografista multimídia Diogo Shiraiwa
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