Mundo vive transformação sem volta para economia verde, diz especialista em sustentabilidade


Jeremy Oppenheim, que fez palestra no Fórum Ambição 2030, promovido pelo Pacto Global no Brasil, afirma que estamos em momento de inflexão semelhante ao das mudanças digitais nos anos 1990

Por Andrea Vialli* — O Globo – 09/03/2023 

Jeremy Oppenheim diz que atualmente há mais investimento em energia limpa do que em combustíveis fósseis Jeremy Oppenheim diz que atualmente há mais investimento em energia limpa do que em combustíveis fósseis Carol Carquejeiro/Valor

A economia global chegou a um ponto de inflexão: ou se move na direção de um modelo de negócios baseado na baixa emissão de carbono, com matriz energética limpa e restaurando a biodiversidade, ou não vai conseguir lidar com desafios como o aumento da pobreza, as pressões inflacionárias e a crise climática. O momento de transformação é semelhante ao vivido na década de 1990, com a ascensão da economia digital impulsionada pelo acesso à internet: em 20 anos, as atividades e setores econômicos ligados à economia verde serão mainstream, enquanto as atividades mais poluidoras cairão na obsolescência.

Essa é a visão do economista britânico Jeremy Oppenheim, CEO e sócio fundador da consultoria Systemiq, especializada em inovação sistêmica em sustentabilidade e um dos principais palestrantes do Fórum Ambição 2030, realizado pelo Pacto Global no Brasil em parceria com a coalizão Aya Earth Partners, em São Paulo, na terça-feira. Oppenheim, que visita regularmente o Brasil desde 1998, quando trabalhava para o Banco Mundial e hoje atua na estruturação de cadeias produtivas sustentáveis na Amazônia, vê o momento como único.

“O Brasil tem todos os pré-requisitos para estar no cerne dessa nova economia emergente, com sua combinação de florestas, matriz energética com alto percentual de fontes renováveis e capital humano”, diz.

Qual sua visão sobre o cumprimento dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) e da Agenda 2030? Quais são as metas que mais avançaram e quais as que têm progresso mais lento?

Fizemos progressos, mas também tivemos retrocessos importantes nos últimos anos. Se olharmos para os indicadores relacionados a direitos humanos, paz, justiça e democracia, como o ODS 16, não podemos ser ingênuos: a guerra entre Rússia e Ucrânia abalou todo o progresso, e ainda houve perdas da integridade da democracia em muitos países, inclusive no Brasil, que sobreviveu a ataques antidemocráticos às instituições.

Entre os indicadores ligados à dimensão social, temos um cenário muito semelhante no curto prazo, especialmente nos últimos três anos, quando retrocedemos em razão da pandemia, da alta nos preços dos alimentos e da energia em razão da guerra. A pobreza aumentou e há mais pessoas sofrendo de fome crônica, o que criou um cenário muito desafiador. Mas há pontos positivos na área de direitos humanos, com o aumento da informação e da conscientização que a tecnologia e as mídias sociais proporcionam, inclusive denunciando cadeias produtivas problemáticas. Entre os indicadores ambientais, é fácil pintar um cenário sombrio, mas quero trazer um certo otimismo.

Onde é possível ser otimista?

No conjunto de indicadores relacionados ao meio ambiente. Por um lado, os riscos são cada vez maiores. Continuamos a emitir gases de efeito-estufa de forma cumulativa na atmosfera, o desmatamento cresce, continuamos a despejar poluentes químicos e plásticos nos oceanos e no meio ambiente de forma acentuada e estamos perdendo áreas ricas em biodiversidade. Por outro lado, o setor de energia limpa recebe mais investimentos do que os combustíveis fósseis. Vejo essa mudança acontecendo em todos os lugares, até mesmo nos países do Oriente Médio, que têm apostado fortemente em ser um hub da economia de energia verde, com energia solar e hidrogênio obtido de fontes renováveis. Vemos países, empresas e investidores reconhecerem que precisam mudar, isso não acontecerá da noite para o dia porque é um sistema que já dura centenas de anos, mas já está acontecendo.

Os fluxos de capital estão se voltando para essa economia?

Está acontecendo. E é negócio, não é mais só responsabilidade social corporativa ou ESG. Hoje, quem está se ocupando da agenda são os CEOs, os diretores financeiros, diretores de estratégia, pois o assunto tomou uma dimensão estratégica. Isso é uma mudança real e está presente em múltiplos segmentos econômicos: sistemas de produção de alimentos, mercado imobiliário, transportes, energia, bioenergia.

Para onde quer que você olhe, é possível ver que a sustentabilidade está tomando outra proporção. CEOs e investidores sabem que precisam criar novos modelos de negócios, com um uso mais eficiente dos recursos naturais, não apenas fazer greenwashing. Há ainda um contexto geopolítico, pois países como Estados Unidos, China e os da União Europeia agora concorrem para ver quem coloca mais recursos nas atividades ligadas à economia verde e indústrias limpas. É um processo de reindustrialização em novas bases.

Fala-se muito no Brasil como um dos países-chave para a economia do futuro, baseada no baixo carbono e na valorização da biodiversidade. No entanto, nossas emissões de gases de efeito-estufa cresceram 12% em 2021, principalmente por causa do desmatamento. O que é preciso para corrigir a rota?

A maior parte do desmatamento é impulsionada por atividades ilegais, seja para conversão de terras para fins agrícolas ou garimpo. Primeiro, é preciso reconstruir as capacidades de fiscalização do Estado e aplicar as leis ambientais. O governo anterior [de Jair Bolsonaro] fechou os olhos e até encorajou as atividades ilegais na Amazônia, e isso levou a recordes no desmatamento, e isso precisa parar. Além disso, são necessários investimentos para aumentar a produtividade da agropecuária, pois não faz sentido ter um ou dois bois por hectare. Mas para avançar temos que tornar mais economicamente viável manter a floresta em pé do que derrubada.

Fazer com que as pessoas que vivem nas bordas da floresta não queiram desmatar, e colocar os incentivos no lugar certo. É preciso criar ativos financeiros a partir dos serviços que a natureza presta, e remunerar as comunidades por esses serviços, e também investir fortemente na educação, especialmente nas vertentes ligadas à tecnologia, para que as pessoas possam ter a opção de permanecer onde vivem e empreender a partir de uma nova visão da economia da floresta.

Como passar do modelo linear de exploração dos recursos naturais para uma abordagem sistêmica?Primeiro, é preciso tornar os negócios da economia limpa, circular e regenerativa mais atraentes. Isso se faz retirando os incentivos ruins, como os subsídios aos combustíveis fósseis e às indústrias lineares e poluentes. Mas é preciso ter em mente que a economia já está em transformação e, em 20 a 25 anos, no máximo, ela será outra. Vejo um paralelo com o que ocorreu com a economia digital nos anos 1990. Estamos exatamente no ponto de inflexão da nova economia.

Quais são os paralelos entre a ascensão da economia da internet e a economia verde?

Um dos paralelos é o aprendizado exponencial que as duas vertentes proporcionam. As sementes da revolução digital deram frutos, de modo que ela se tornou mainstream na década de 2010 e hoje as empresas mais valiosas são do setor de tecnologia da informação. O meio do caminho foi por volta de 2005, quando os smartphones começaram a se popularizar, a era do iPhone veio em seguida, as mídias sociais explodiram e hoje moldam comportamentos.

No que tange à economia verde, em 2023 estamos exatamente nesse meio do caminho, nesse ponto de inflexão. A aceleração desse potencial virá, pois há forças regulatórias e também de mercado levando a esse caminho. Tal como na economia digital, havia os críticos, que diziam que aquilo tudo não passava de uma “bolha da internet”. Hoje existe essa reação, especialmente de políticos e empresários conservadores em relação ao ESG, mas o caminho é sem volta.

https://oglobo.globo.com/economia/noticia/2023/03/mundo-vive-transformacao-sem-volta-para-economia-verde-diz-especialista-em-sustentabilidade.ghtml

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