Raquel e os robôs – UMA REPÓRTER DE RUA


Por Ruth de Aquino O Globo 07/01/2021 

Raquel Krähenbühl, 36 anos, saiu de DC (Dois Córregos, SP) e foi para DC (Washington, EUA). Mantém a temperatura da notícia, ao vivo, no lugar certo, sem recorrer a estridências. Raquel Krähenbühl, 36 anos, saiu de DC (Dois Córregos, SP) e foi para DC (Washington, EUA). Mantém a temperatura da notícia, ao vivo, no lugar certo, sem recorrer a estridências. | Reprodução

A repórter Raquel Krähenbühl, da GloboNews, é a prova mais visível, hoje, no Brasil, do valor de uma correspondente internacional de rua. Olhar Raquel perdendo o fôlego – mesmo sendo professora de kundalini yoga – aos 36 anos, máscara no rosto, microfone na mão, mostrando bastidores do caos após a invasão do Capitólio, descendo ao porão, nos garante que a reportagem jamais será substituída por robôs. Em qualquer plataforma. TV, sites ou impressos. 

Jornalismo é gastar sola de sapato, cansar os olhos e os ouvidos de tanto verificar, observar, apurar. A definição é de Gay Talese, o padrinho do new journalism ou jornalismo literário. Não há “narrativa” ou “opinião” que se sobreponha à realidade bem contada. De personagens anônimos ou famosos. O texto precisa ser tão sedutor e honesto que leve alguém a deixar o pão queimar na torradeira. Quem disse isso foi Tomás Eloy Martinez, escritor e jornalista argentino. Nada de florear ou trapacear. A honestidade talvez seja a única opção para quem deseja criar um texto jornalístico ou entrevistar na televisão. 

Em tempos de pandemia, com o mundo quarentenado, as análises ajudam a refletir, a contextualizar. Os artigos nos levam a concordar ou discordar, a nos emocionar ou irritar. Os colunistas nos permitem discutir em família com mais conhecimento, profundidade e substância. Mudam nossa perspectiva às vezes.

Mas a reportagem quente de rua é o que mais me comove no jornalismo. Raquel se mudou para os Estados Unidos em meados dos anos 2000 sem dominar o inglês. Começou na produtora de Luís Fernando Silva Pinto, correspondente veterano que se despediu recentemente da Globo. Ela se diz “aprendiz de DJ” em seu perfil no Instagram. Raquel virou celebridade entre colegas estrangeiros em Washington, “a repórter brasileira”. Por seu estilo furão. Carisma e falta de arrogância. As perguntas desabridas. E sua aparente calma. Às vezes parece assustada. Está mesmo. Não é um robô. 

“Vou de mochila, celular e carregador extra de bateria”. O tripé onde coloca o smartphone, pelo qual grava e realiza transmissões ao vivo, é deixado dentro do setor de imprensa na Casa Branca. “Hoje o celular resolve quase tudo, facilita a locomoção, diminui custos de transmissão. Mas ter uma equipe resulta em imagens melhores”. Um câmera, como Daniel (@danthecameram4n), ajuda demais. Raquel mantém a temperatura da notícia sem apelar a estridências. 

Furos. Tesão. Sensibilidade. Argúcia. Coração bate rápido ao testemunhar acontecimentos, registrar imagens ou descobrir falcatruas. Coisa boa que nos faz acreditar na arte de contar histórias. Caco Barcellos sabe tanto disso que formou gerações de jovens repórteres. Raquel repete o mantra dos veteranos: “A gente rala mas se diverte”. Ben Bradlee, editor do Washington Post que denunciou o Watergate, escreveu um livro de cabeceira, “A good life”. 

Não parece “so good” quando escutamos que robôs começam a substituir jornalistas. Não dá para competir com os 175 bilhões de parâmetros do algoritmo GPT-3, que produziu para o jornal inglês ‘The Guardian’ um artigo intitulado: “Um robô escreveu este artigo inteiro. Você ainda está com medo, humano?” 

Pior será se algum dia não conseguirmos distinguir entre uma matéria de robô e uma matéria de jornalista de carne e osso. Os robôs organizam os dados. Mas não substituem a inspiração, o estilo, o encantamento, a emoção. Não se plugue no automático. Se você não quer ser substituído por um robô, não trabalhe como um. 

https://blogs.oglobo.globo.com/ruth-de-aquino/post/raquel-e-os-robos.html

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