O emprego dos sonhos na área de tecnologia está morto; entenda


É a era do “cale a boca e trabalhe duro”, dizem os profissionais da área de tecnologia, à medida que Apple, Google, a Meta e outras gigantes se transformam em grandes burocracias

Por Kate Conger – Estadão/The New York Times – 10/08/2025

Quando Rachel Grey começou a trabalhar no Google como engenheira de software, em 2007, era um bom momento para ser uma “Noogler”*, ou como a gigante das buscas chamava seus novos funcionários.

Durante uma orientação de duas semanas na sede do Google, em Mountain View, Califórnia, Rachel descobriu uma utopia de benefícios. As lanchonetes da empresa serviam bife e camarão, as cozinhas estavam abastecidas com sucos frescos e as academias ofereciam aulas de ginástica gratuitas. Os funcionários recebiam ações além de seus salários, uma contrapartida de 50% em suas contribuições para a aposentadoria e um bônus de Natal na forma de US$ 1000 dentro de um envelope.

O que também impressionou Rachel durante a orientação foi que o Google revelou quantas máquinas havia em seus data centers. “Vi como as coisas eram transparentes na empresa”, disse ela sobre as informações normalmente mantidas em segredo.

Com o passar dos anos, porém, sua experiência mudou quando ela se tornou gerente de engenharia de software. O bônus de Natal diminuiu. Os funcionários não recebiam mais uma enxurrada de informações corporativas. A empresa abandonou a promessa de que sua inteligência artificial (IA) não seria usada para armas. O orçamento para promoções secou, pressionando Rachel a reduzir as avaliações de desempenho, o que ela disse ser “incrivelmente doloroso”. Em abril, com quase 18 anos de casa, a funcionária de 48 anos deixou o que antes era o emprego dos seus sonhos.

A vida dos funcionários das maiores empresas de tecnologia do Vale do Silício é diferente. Muito diferente.

Já se foram os dias em que Google, Apple, Meta e Netflix eram os destinos dos sonhos dos trabalhadores de tecnologia, oferecendo salários altos, campi corporativos luxuosos e culturas em que se podia dizer e fazer qualquer coisa. Agora, as gigantescas empresas se transformaram em grandes burocracias. Embora muitas delas ainda ofereçam alimentação gratuita e paguem bem, elas têm poucos escrúpulos em cortar empregos, exigir a presença obrigatória no escritório e reprimir o debate entre os funcionários.

É a era do “cale a boca e trabalhe duro”, disseram os trabalhadores.

“A área de tecnologia ainda pode ser a melhor em termos de almoço grátis e salário alto”, disse Rachel, mas “o nível de medo aumentou muito”.

“Acho que é melhor ter almoço e morrer de medo do que não ter almoço e morrer de medo, mas não sei se é bom para você estar lá”, acrescentou ela.

Uma porta-voz do Google disse que muitos funcionários foram promovidos e que a empresa mudou seu sistema de gestão de desempenho para recompensar melhor os funcionários com melhor performance. A empresa introduziu políticas destinadas a incentivar os funcionários a se concentrarem em seu trabalho, mantendo-se fiéis aos objetivos e à cultura do Google, acrescentou ela.

À medida que as empresas de tecnologia se tornaram entidades gigantescas, com forças de trabalho maiores do que muitas cidades — e custos correspondentes —, o escrutínio também aumentou. Meta, Google, Apple e outras foram levadas a fazer mudanças à medida que os trabalhadores e o público questionavam seu poder.

O ponto de inflexão ocorreu em 2022 e 2023, quando Elon Musk comprou o Twitter (agora, X) e demitiu três quartos de seus funcionários, enquanto o CEO da Meta, Mark Zuckerberg, cortou milhares de empregos durante o que chamou de “um ano de eficiência”. O Google e a Amazon também realizaram demissões em massa. Muitas das empresas culparam a pandemia pelo excesso de contratações durante os lockdowns, à medida que mais pessoas passaram a utilizar serviços digitais.

Ao longo do caminho, as empresas tornaram-se menos tolerantes com a franqueza dos funcionários. Os chefes reafirmaram sua autoridade depois que os trabalhadores protestaram contra questões como o assédio sexual no local de trabalho. Com o mercado de trabalho inundado de engenheiros qualificados, ficou mais fácil substituir aqueles que criticavam.

“Este é um negócio, e não um lugar para agir de forma a perturbar os colegas de trabalho ou fazê-los se sentir inseguros, tentar usar a empresa como uma plataforma pessoal ou brigar por questões perturbadoras ou debater política”, disse Sundar Pichai, CEO do Google, em uma postagem no blog no ano passado.

Alguns diriam que as mudanças simplesmente alinharam os trabalhadores de tecnologia com o resto das empresas americanas, onde os funcionários estão acostumados a cumprir as prioridades corporativas.

Mas a mudança na tecnologia foi agravada pelo surgimento da inteligência artificial generativa, que, segundo os executivos, já tornou alguns empregos redundantes. Em janeiro, Zuckerberg disse acreditar que a IA substituiria alguns engenheiros de nível médio este ano. Musk foi além, prevendo no ano passado que a IA acabaria eliminando todos os empregos.

“A maré definitivamente virou contra os trabalhadores da área de tecnologia”, disse Catherine Bracy, fundadora e diretora executiva da TechEquity, uma organização sem fins lucrativos que promove a inclusão econômica no setor. “As empresas têm ainda mais poder de influência sobre os trabalhadores, e a inteligência artificial está potencializando isso.”

Liz Fong-Jones, diretora de tecnologia da Honeycomb, uma empresa de São Francisco que ajuda engenheiros a encontrar e corrigir problemas em seus códigos, disse que o efeito da IA sobre os empregos foi exagerado. Mas isso pode mudar daqui a cinco anos, alertou ela.

Os trabalhadores da área de tecnologia poderiam impedir que a IA se consolidasse, disse Liz, ex-funcionária do Google, acrescentando: “mas todos nós temos medo o suficiente para concordar em treinar nossos próprios substitutos”.

Para alguns trabalhadores da área de tecnologia, a mudança no local de trabalho foi abrupta. Adam Treitler, 32, estrategista de recursos humanos que trabalhou no escritório do Twitter, em Nova York, antes e depois da aquisição de Musk, disse que as mudanças da empresa sob o novo proprietário foram surpreendentes.

“Do dia anterior a Elon ao dia seguinte a Elon, a empresa mudou da noite para o dia de ‘como podemos melhorar a gestão de RH’ para ‘qual é o menor número de etapas envolvidas e o menor número de pessoas necessárias para pagar nossos funcionários’”, disse Treitler, que ingressou no Twitter em 2021 e saiu em janeiro de 2023. Ele agora trabalha para a empresa de joias Pandora.

O X não respondeu a um pedido de comentário.

Outros disseram que a mudança ocorreu mais lentamente. Ava Sazanami, uma designer de 40 anos, em Seattle, ingressou na Meta em 2022 para criar ferramentas para ajudar os usuários com suas configurações de privacidade. A mãe de dois filhos disse que se sentiu empoderada para ajudar a resolver algumas das preocupações tecnológicas que a incomodavam como mãe.

A Meta também permitiu um horário flexível para que ela pudesse acompanhar seus filhos a consultas, e as políticas favoráveis à comunidade LGBTQ a fizeram se sentir bem-vinda, pois ela tinha familiares gays, disse ela.

Mas, com o tempo, a Meta reduziu seus benefícios familiares, disse Ava. Em janeiro, a empresa encerrou seus programas de diversidade e políticas de mídia social contra discursos de ódio direcionados a pessoas LGBTQ. Um mês depois, ela foi demitida quando a Meta cortou 5% de sua força de trabalho.

“Estamos vendo agora por que a tecnologia precisa de sindicatos”, disse Eva, que está procurando um novo emprego. “A cultura atual tirou o poder dos trabalhadores.”

Um porta-voz da Meta se recusou a comentar. Em uma teleconferência sobre os resultados financeiros em janeiro, Zuckerberg disse: “Operamos melhor como uma empresa mais enxuta”.

Alguns trabalhadores estão deixando grandes empresas de tecnologia para ingressar na área de inteligência artificial. Jason Yuan, 28, começou como designer na sede da Apple em Cupertino, Califórnia, em 2021. Ele disse que foi uma sorte trabalhar para uma empresa que ele admirava por seu design.

No entanto, após o boom da IA com o lançamento do ChatGPT, da OpenAI, em 2022, Yuan disse que ansiava por se envolver. Em 2023, ele deixou a Apple para fundar a New Computer, uma empresa que fabrica um chatbot pessoal. Ele espera trabalhar mais rapidamente e ganhar mais dinheiro, já que a IA provavelmente o substituirá ainda durante sua vida, disse ele.

“Estamos chegando ao fim de nossa vida econômica”, disse ele, acrescentando: “Há uma sensação de que preciso fazer com que tudo o que faço agora valha a pena”.

A Apple se recusou a comentar.

Para Rachel os emocionantes primeiros dias do Google parecem outra vida. O trabalho nem sempre foi fácil, disse ela, mas a cultura da empresa tornou mais fácil seguir em frente. Um dia, ela lembrou, ela e seus colegas de trabalho chegaram e encontraram armas Nerf em suas mesas. Quando houve uma queda de energia, desligando os computadores, eles pegaram suas armas Nerf e começaram uma briga amigável.

“O Google tinha um brilho especial naquela época”, disse ela. “Havia uma alegria institucionalmente aprovada em tudo isso. Eu adorava isso.”

Agora, “o futuro de toda a indústria parece muito instável”, disse Rachel, que está tirando uma folga da área de tecnologia.

*Noogler é o termo usado no Google para se referir aos novos funcionários da empresa. É uma combinação das palavras “new” (novo) e “Googler” (funcionário do Google). Normalmente, os Nooglers recebem um chapéu com um helicóptero no topo e a palavra “Noogler” bordada. Este chapéu é usado durante a primeira reunião “TGIF” (Thank God It’s Friday) da semana. O termo “Noogler” também é usado para descrever o processo de integração dos novos funcionários. 

O termo “Noogler” tem como objetivo criar um senso de inclusão e acolhimento para os novos funcionários, ajudando-os a se sentirem parte da equipe e do ambiente do Google, diz um blog sobre o Google Brasil. O chapéu do Noogler é um símbolo que reforça essa ideia e faz parte da cultura divertida e descontraída do Google. 

Além do chapéu, os novos funcionários recebem um “buddy” (parceiro de integração) para ajudá-los a se ambientar na empresa e na cultura do Google. O “buddy” auxilia o Noogler a entender os processos, tirar dúvidas e se sentir mais confortável no novo ambiente. 

O emprego dos sonhos na área de tecnologia está morto; entenda – Estadão

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