Onda de reestruturação em empresas, incluindo as startups, deixa profissionais de tecnologia sem lugar no mercado
Por Luana Reis* – O Globo – 24/12/2023
Quem nunca ouviu que na Tecnologia da Informação (TI) ninguém fica desempregado? Com a introdução de inovações em inteligência artificial (IA) e a multiplicação de startups, seria esperada uma explosão de vagas no setor, mas não é necessariamente a realidade. Têm sido frequentes no LinkedIn relatos de profissionais de TI se queixando de demissões e da dificuldade de encontrar boas propostas de recolocação.
Segundo recrutadores e consultores de Recursos Humanos (RH), TI continua um dos setores que mais empregam, mas os profissionais mais voltados para suporte, atendimento e outras demandas que a IA pode resolver começam a perder espaço para os mais especializados nessa nova tecnologia.
Além disso, 2023 foi de juros ainda altos e termina com desaceleração econômica. Isso desestimulou investimentos e contratações nas empresas, incluindo as startups, enquanto mais gente era atraída para a TI.
Contingente maior
Dados da plataforma de recrutamento e seleção Gupy mostram que, entre 2020 e 2023, houve alta de mais de 800% no número de inscritos para vagas de desenvolvedor, por exemplo, mas o de contratações permaneceu estável.
Karenyn Menezes, de 33 anos, que está desempregada desde agosto, já acumula 60 candidaturas em uma plataforma de vagas e sequer foi chamada para uma entrevista. Formada em Ciências Contábeis, atua há 4 anos na área de TI, com análise de dados, mas se surpreendeu com a dificuldade de achar trabalho agora:
— Achava que nunca ficaria sem oportunidade. No começo da carreira, via muita vaga de TI em todo o canto do país. Tenho procurado no LinkedIn e nas plataformas de vagas, mas o retorno é muito difícil, fora que os processos seletivos são muito cansativos. Fiz oito testes de uma hora para uma vaga e nem tive retorno.
Formado em Ciências da Computação, Magno Lessa, de 36 anos, foi demitido no começo do ano. Levou dois meses para encontrar nova vaga.
— Até meados de 2022, eu sempre recebia ofertas no LinkedIn. Neste ano, comecei a aplicar para muitas vagas e não fui chamado para entrevistas. Muitas vezes, a descrição da vaga batia com minha experiência. No final, só consegui uma oportunidade porque uma pessoa que já trabalhou comigo fez uma indicação — relata. — Muitos amigos meus estão fora do mercado. Muitas empresas demitiram, o que acabou inflando a quantidade de pessoas em busca de emprego. Vi vagas com 50 a 100 candidaturas menos de uma hora depois de postadas.
Salários estagnados
Segundo levantamento da consultoria Bain & Company, houve estagnação nos salários da área de dados após alta de 40% entre 2019 e 2021. Em 2022, a variação média da remuneração foi de 4%, abaixo da inflação de 5,8%. A pesquisa apontou que 74% dos trabalhadores de TI estão satisfeitos com seus empregos atuais, embora 65% estejam abertos a mudar. Principalmente por falta de oportunidades de crescimento (44%) e remuneração incompatível (39,2%).
Um mapeamento da consultoria de RH Michael Page concluiu que 7 em cada 10 cargos da área de TI tiveram aumento acima da inflação em 2023, mas 16% não tiveram reajuste e 8% tiveram redução salarial.
— Os cargos em tecnologia que tiveram queda de salário são mais da área de suporte. Provavelmente essa queda tem muito a ver com a IA. São cargos de suporte, atendimento e de uma série de coisas que a IA “resolve”. Por isso o profissional tem a sensação de estar perdendo espaço e valor para a IA — explica Luciana Carvalho, CEO da HRtech Chiefs.
Mão dupla
Por outro lado, ela aponta que é alta a demanda agora por especialidades mais avançadas, como machine learning (aprendizado de máquina), segurança da informação e desenvolvimento de tecnologias.
— Pode ser que haja vários profissionais disponíveis, mas não necessariamente têm o que o mercado está buscando — diz. — Ainda há escassez grande de profissionais de tecnologia qualificados no país.
A executiva também aponta uma mudança no cenário econômico, que interrompeu a fase de expansão do setor liderada pelas startups desde 2019, o que afeta as contratações.
— No atual cenário, diminuiu o apetite ao risco, o que fez os investidores cobrarem resultados mais concretos. Isso desacelerou os investimentos aqui e no mundo, e vimos muitas demissões no começo do ano — diz Luciana, que prevê melhora em 2024.
*Estagiária sob supervisão de Danielle Nogueira
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