O Brasil e a pressão sobre minerais críticos


Intensificação da rivalidade entre EUA China elevará pressões sobre produtores como Brasil

Por Assis Moreira – Valor – 23/05/2024 

A intensificação da rivalidade geopolítica entre os Estados Unidos e a China transborda para o campo dos minerais essenciais, sem surpresa, e elevará as pressões sobre produtores como o Brasil.

Minerais críticos como terras raras, lítio, cobalto e nióbio são essenciais para muitas tecnologias modernas e para a segurança nacional e econômica. E diferentes países fazem uma corrida para garantir suprimento que assegure suas ambições econômicas e ambientais.

A China domina atualmente o processamento global de minerais essenciais muito procurados para a fabricação de baterias para veículos elétricos e armazenamento de energia renovável. De seu lado, os EUA negociam acordos com mais países para expandir seu acesso a esses minerais importantes.

Com produção nacional limitada, tanto os Estados Unidos quanto a Europa dependem muito das importações, incluindo da China, fornecedora de commodities como grafite, elementos de terras raras e outros minerais para baterias, e da Rússia, que fornece alumínio, níquel e titânio.

Washington e Bruxelas procuram assim atrair países em desenvolvimento para parcerias visando “alinhar’” medidas sobre fornecimento de matérias-primas críticas. Pelo recentemente lançado Fórum de Parceria para Segurança de Minerais, dizem ter nova e potencialmente melhor oferta que criaria mais valor agregado nesses países.

O Brasil é o maior produtor mundial de nióbio, com 92% do total, conforme estudo da UE. O produto serve para aplicações de alta tecnologia (condensadores, supercomputadores etc.). Também produz 13% da bauxita no mundo, para produção de alumínio; 8% do grafite natural, usado para baterias e material para produção de aço; e 9% do tântalo mundial, que serve para superligas e compensadores para dispositivos eletrônicos.

Os EUA têm insistido em obter do Brasil um compromisso de o país não restringir exportações dos minerais críticos. Os americanos negociaram também com a UE, anunciaram acordo com a Índia que ninguém viu o conteúdo e têm um acordo com a Austrália que não inclui não restringir a venda.

Nesse contexto, uma recente declaração da embaixadora dos Estados Unidos no Brasil, Elizabeth Bagley, de que os EUA pretendem comprar minerais críticos do país, deflagrou sinal de alerta em círculos do governo em Brasília. A fala foi vista como nada trivial do tipo “queremos minerais críticos”, ou seja, ter simplesmente o acesso. Já o objetivo destacado em Brasília vai na outra direção, de estimular o processamento e agregação de valor dessas commodities no país.

Ou seja, não é só resistência a compromisso de não restringir exportações. Sobretudo, existe a noção de que o tema deve ser tratado de maneira estratégica e preservar espaço de política pública para uma questão ainda está sendo definida.

A União Europeia também busca explorar com o Brasil uma parceria estratégica em matérias-primas críticas para a transição verde e digital. E, conforme relatos, esse foi um dos temas que levaram o governo de Lula 3.0 a rediscutir o acordo Mercosul-UE, com avaliação de que o pacote negociado no governo anterior não era palatável porque proibia qualquer restrição de acesso a esses minerais críticos.

Em termos de investimentos para produção local, até agora as cifras são irrisórias. No fim de 2022, Joe Biden anunciou que uma agência americana faria novo investimento de US$ 30 milhões (R$ 158 milhões) na empresa de mineração TechMet para transformação de minerais estratégicos níquel e cobalto no Brasil.

Estudo da Unctad, agora rebatizada de ONU Comércio e Desenvolvimento, sugere aos países em desenvolvimento focar efetivamente no valor agregado em componentes de energia renovável, para reforçar seus setores industriais, diversificar suas economias e redefinir seu papel na economia global.

Exemplifica com o caso da República Democrática do Congo, no qual a China tem acesso a várias commodities importantes. Com o refino local do cobalto, o país reforçou os ganhos, de US$ 5,6 por quilo na extração para US$ 16,2 após processamento.

Com alta da emergência climática, demanda aumentando para tecnologias renováveis como carros elétricos, placas solares e turbinas eólicas, a agência da ONU projeta que a demanda de lítio aumentará em até 1.500% até 2050, com idêntica alta para níquel, cobalto e cobre.

A oferta não acompanha a demanda e em algum momento haverá uma crise. A Unctad identificou 110 novos projetos de mineração globalmente, no valor de US$ 39 bilhões, com US$ 22 bilhões investidos em 22 projetos em países em desenvolvimento.

No entanto, para alcançar a meta de emissões líquidas zero em 2030, a indústria pode precisar de 80 novas minas de cobre, 70 novas minas de lítio e níquel e outras 30 de cobalto. O investimento necessário entre 2022-2030 varia de US$ 360 bilhões a US$ 450 bilhões, potencialmente resultando um “gap” de até US$ 270 bilhões.

De seu lado, a Organização Mundial do Comércio (OMC) constata que a forte demanda de minerais críticos ligados à energia exerce uma pressão sobre as cadeias de fornecimento. Nos últimos 20 anos, o montante do comércio anual desses minerais ligados à energia pulou de US$ 53 bilhões para US$ 378 bilhões.

Ao mesmo tempo, as restrições à exportação aumentaram, passando de 396 medidas em 2009 para 489 em 2012 e 502 em 2021, com pressões à alta sobre os preços mundiais e inquietações sobre a segurança do fornecimento.

Assis Moreira é correspondente em Genebra e escreve quinzenalmente

E-mail: assis.moreira@valor.com.br

https://valor.globo.com/brasil/coluna/o-brasil-e-a-pressao-sobre-minerais-criticos.ghtml

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